Saturday, January 28, 2006

Munique (Munich, 2005)



De quatro em quatro anos, atletas do mundo todo se reúnem para participar dos Jogos Olímpicos. Durante a competição, os países colocam as suas divergências de lado e entram em um espírito único de paz e de fraternidade. Mas, no dia 05 de Setembro de 1972, em meio aos Jogos Olímpicos de Munique (Alemanha), a paz foi quebrada quando terroristas do grupo palestino Setembro Negro anunciaram o seqüestro de onze atletas israelenses. Os terroristas só iriam libertar os atletas quando Israel liberasse duas centenas de prisioneiros árabes. Exigência não atendida, o saldo final foi a morte dos onze esportistas.

Os primeiros vinte minutos de “Munique”, novo filme do diretor Steven Spielberg, retratam como a ação dos terroristas palestinos aconteceu – na maior parte das cenas, vemos o seqüestro ser retratado pelas emissoras de TV, num paralelo muito interessante com o mundo atual, em que os conflitos entre as nações são mostrados minuto a minuto pelas câmeras de TV. Mas, o grande objetivo de “Munique” não é dissecar o seqüestro dos atletas israelenses, e sim mostrar aquilo que aconteceu depois do ato terrorista.

É desta maneira que ficamos conhecendo a história de um esquadrão formado por agentes do Mossad, o serviço secreto israelense, designado para perseguir e matar os onze palestinos suspeitos de terem planejado o seqüestro dos atletas israelenses no Jogos Olímpicos de 1972. Com esta operação, a primeira-ministra israelense Golda Meir queria mostrar que, atacar os israelenses, podia custar muito caro.

Para liderar o esquadrão, Golda Meir destacou Avner Kaufman (o ator australiano Eric Bana, numa excelente performance), um ex-guarda-costas seu e o filho de um herói de guerra israelense – o qual terá ao seu lado, na difícil missão, quatro homens (Daniel Craig, Ciaran Hinds, Mathieu Kassovitz e Hanns Zichler) especialistas em cada uma das áreas que são necessárias para a execução do plano idealizado pelo governo de Israel.

“Munique” é um filme muito lento e que privilegia o pleno desenvolvimento de sua história. É justamente o roteiro escrito por Tony Kushner (o aclamado dramaturgo de “Angels of America”) e Eric Roth a grande estrela de “Munique” – ofuscando até mesmo o eficiente elenco e a ótima direção de Steven Spielberg. O filme consegue uma proeza: ser totalmente imparcial, pois dá voz a todos os lados da história ao mostrar que todos eles têm fortes razões para realizar atos que, para a maioria das pessoas, parecem incompreensíveis.

No entanto, “Munique” é uma grande peça de transformação e de reflexão; e a grande prova de que Steven Spielberg não é mais aquele diretor que acredita em um mundo colorido e cheio de fantasias. Não é que o diretor tenha virado um pessimista. Ele só está mais realista e consciente de que, infelizmente, a situação do mundo só tende a piorar. Avner, seus companheiros de missão e nós da platéia, ao vivenciarmos os acontecimentos retratados em “Munique”, também chegaremos à mesma conclusão.

Crédito da Foto: Yahoo! Cinema

Wednesday, January 25, 2006

As Loucuras de Dick e Jane (Fun With Dick and Jane, 2005)



Uma das maiores surpresas do cinema em 2005 foi o filme “O Virgem de 40 Anos”, no qual o diretor e roteirista Judd Apatow fala sobre um homem que se mantém virgem até os 40 anos de uma maneira às vezes escrachada, mas principalmente delicada. Neste filme, Apatow reuniu-se ao comediante em ascensão Steve Carell, que roubou a cena do astro Jim Carrey em alguns momentos do filme “Todo Poderoso”. Em “As Loucuras de Dick e Jane”, Apatow escreveu (ao lado de Nicholas Stoller e Peter Tolan) um roteiro especialmente para Carrey, mas deixou a direção a cargo de Dean Parisot.

O casal Dick (Jim Carrey) e Jane Harper (Téa Leoni) vivem o sonho americano. Os dois trabalham feito loucos (ele na Globodyne, uma empresa de informática; e ela em uma agência de viagens) para manter um alto padrão de vida – o qual inclui casa no subúrbio, carros de última geração, um gramado novinho e uma piscina recém-comprada. Dick vê 15 anos de trabalho árduo serem recompensados quando ele é chamado pelo presidente da Globodyne (Alec Baldwin) e é informado de que foi promovido à vice-presidente de comunicações da empresa.

A promoção de Dick faz com que Jane consiga realizar um antigo desejo: o de largar o emprego para se dedicar somente aos cuidados com a casa e com o filho Billy. Mas, no primeiro dia de trabalho de Dick no novo cargo, o casal é surpreendido com a notícia da falência da Globodyne – por total imprudência do presidente da companhia, que realizou algumas transações escusas. Dick não conseguirá recolocar a sua vida nos eixos e, depois de ver tudo aquilo pelo qual batalhou indo para o ralo, ele e Jane tomam uma decisão drástica – o casal irá se transformar em uma versão “trash” de Bonnie e Clyde e realizará pequenos roubos fantasiados de Cher e Sonny Bono e vestindo máscaras com os rostos de Bill e Hillary Clinton.

“As Loucuras de Dick e Jane” pertence a Jim Carrey, uma vez que o roteiro do filme constrói situações que favorecem o tipo de comédia física que é uma especialidade de Carrey. No entanto, por trás de tanto sarcasmo e ironia, o filme esconde uma bela crítica ao escândalo da Enron (empresa norte-americana do setor de energia que pediu concordata em 2001, depois de ter sido alvo de uma série de denúncias de fraudes fiscais e contábeis) – nos créditos finais de “As Loucuras de Dick e Jane” foi colocada uma lista de agradecimentos especiais a todos os nomes envolvidos no acontecimento.

Crédito da Foto: Cine Pop

Saturday, January 21, 2006

A Marcha dos Pinguins (March of the Penguins/La Marche de L'Empereur, 2005)



Toda a narrativa do documentário “A Marcha dos Pingüins”, do diretor francês Luc Jacquet, se passa no inverno da Antártica, o local mais inabitável da Terra, a uma temperatura de 41º C negativos. Para o homem, esse é um ambiente completamente inóspito e devastador. O documentário mostra que, para milhares de pingüins imperadores, a Antártica se transforma no local ideal para a realização de diversas marchas, todas elas servindo de apoio para aquele que é o maior ato que um ser pode fazer: o de dar a vida a alguém.

A cada inverno, mais precisamente no terceiro mês de cada ano, os pingüins imperadores abandonam o oceano – o seu lar mais seguro e do qual eles tiram a sua sobrevivência – e iniciam uma longa jornada rumo ao interior da Antártica, aonde eles encontram outros pingüins imperadores. Pelo período de nove meses, esses pingüins passarão por um ritual que inclui um casamento, a geração de um filhote e a conseqüente luta pela sobrevivência deles e dos filhos que eles conceberam.

Durante “A Marcha dos Pingüins”, as passagens mais importantes do documentário (como o seu início, a dança nupcial, a volta da pingüim fêmea para o oceano e os primeiros passos do filhote) são pontuados por belas canções. No resto do filme, somos brindados com uma narração (na versão brasileira, esta ficou a cargo de Antonio Fagundes, Patrícia Pillar e Matheus Perissè), que tenta colocar em palavras todo um ritual que, aparentemente, só faz sentido para os pingüins imperadores.

“A Marcha dos Pinguins” pode ganhar de algumas pessoas o título de “Documentário Discovery”, pois mostra como os pingüins imperadores se comportam num determinado período de tempo. Esta alcunha não faz jus ao documentário, uma vez que o filme vai além do comportamento dos pingüins. O feito do diretor Luc Jacquet se torna ainda mais extraordinário se levarmos em consideração o fato de que, ao contrário de outros documentários, “A Marcha dos Pinguins”, por ter sido filmado em um ambiente natural, teve que ficar à mercê das condições normais de temperatura e clima. Os pingüins imperadores que vemos na tela não foram treinados, pelo contrário, eles foram flagrados em seus momentos mais íntimos pelas câmeras de Jacquet.

Através de suas belas imagens, Luc Jacquet fez de “A Marcha dos Pinguins” um filme muito sensível, emocionante e que quebra barreiras ao mostrar que os seres humanos e animais seguem trajetórias semelhantes de vida. Todos temos os mesmos instintos de sobrevivência e de proteção e, num momento ou outro, aprendemos que, na verdade, na vida nós temos que aprender a andar com as nossas próprias pernas sozinhos.

Sunday, January 15, 2006

Tudo em Família (The Family Stone, 2005)

Um dos traços mais característicos do ser humano é que ele tem uma grande necessidade de adequação. Nós sempre queremos causar uma boa impressão, ser agradáveis ou, simplesmente, estar de acordo com alguma situação. Algumas pessoas chegam até ao extremo de modificar o seu jeito de ser só para serem aceitas em algum local ou por alguém. A comédia “Tudo em Família”, do diretor e roteirista Thomas Bezucha, trata justamente de um destes momentos em que só o que queremos é ser respeitados – e morremos de medo de que isso não aconteça.

Meredith Morton (Sarah Jessica Parker, em uma atuação que lhe rendeu uma indicação ao Globo de Ouro 2006 de Melhor Atriz num Filme Musical ou de Comédia) é uma daquelas pessoas que adora ter o controle da situação – a ponto de fazer com que nós da platéia passemos a acreditar que por trás de tanta perfeição e comedimento se esconde um ser cheio de falhas. É ela quem manda no relacionamento com Everett Stone (o maravilhoso Dermot Mulroney), um cara que aparenta estar meio perdido ao lado de Meredith.

Na época do Natal, Everett decide levar Meredith para conhecer a sua família, que é formada por tipos muito diversos: têm a irmã rebelde (Rachel McAdams), a irmã dona-de-casa, o irmão irresponsável (Luke Wilson) e o caçula que é surdo e gay. No meio de tudo isso, se encontram os pais de Everett: Sybil (Diane Keaton, excelente como sempre) e Kelly (Craig T. Nelson), que mal conseguem administrar tanta diversidade.

A família Stone se vê em uma situação complicada quando Everett leva Meredith para casa. Acostumados a um ambiente mais livre, os Stone não entendem o nervosismo e a falta de tato de Meredith. Tanta antipatia fará com que a namorada de Everett seja recepcionada de uma forma nada agradável. Pela primeira vez, Meredith vê uma situação sair de seu controle e, por isso, chama a irmã mais nova Julie (Claire Danes) para ajudá-la. A presença de Julie no Natal da família Stone irá abalar ainda mais os já frágeis relacionamentos que todos ali possuem.

“Tudo em Família” é uma excelente comédia familiar. A maior parte da narrativa do filme se passa na casa da família Stone, e é nesse ambiente que podemos ver nascer todas as virtudes e defeitos de cada personagem, ao mesmo tempo em que os segredos de todos eles começam a desaparecer. Thomas Bezucha criou um roteiro extremamente crível e que se aproxima da realidade de qualquer família, afinal, atire a primeira pedra aquele que nunca conheceu uma Meredith.

Wednesday, January 11, 2006

Soldado Anônimo (Jarhead, 2005)



“Soldado Anônimo”, do diretor inglês Sam Mendes, poderia ser a história de qualquer recruta norte-americano. No caso particular do filme, ele é narrado por Anthony Swofford (Jake Gyllenhaal), um jovem de 20 anos que se alistou no Corpo de Fuzileiros Navais, pois “se perdeu no meio do caminho para a faculdade”. Apesar de seu pai e tio terem lutado na Guerra do Vietnã, Swoff não sabe muito bem o por quê de ter acabado no serviço militar. Logo ele irá saber que a vida militar não é nada fácil.

Podemos dividir a passagem de Swoff pelo Corpo de Fuzileiros Navais em dois momentos distintos. No primeiro deles, Swoff e seus companheiros de destacamento passam por duros dias de treinamento, que simulam cenas de combate e possíveis alvos na guerra. No segundo momento, Swoff e seus companheiros são enviados para a Guerra do Golfo, onde ficarão no destacamento comandado pelo Sargento Sykes (Jamie Foxx).

É justamente neste segundo momento que “Soldado Anônimo” toma um rumo completamente inesperado e surpreendente. Ao contrário de outros filmes da tradicional escola cinematográfica hollywoodiana como “Glória Feita de Sangue”, “Apocalypse Now”, “Nascido Para Matar”, “Platoon” e “O Resgate do Soldado Ryan”, que retratam a guerra sob um ponto de vista mais cru e real; “Soldado Anônimo” mostra um outro lado da batalha: o tédio da guerra, por isso não veremos na tela aquelas cenas cheias de sangue e de mortes.

Quando pisam em solo iraquiano, o destacamento de Swoff não vai para o campo de batalha. Eles continuam a fazer simulações de combate, a fazer o reconhecimento do deserto e a proteger as preciosas bacias de petróleo do Oriente Médio. Sedentos pela verdadeira guerra, os comandados de Sykes aceitam todas as recomendações sem contestações. Na medida em que os dias vão passando e mais tropas vão chegando ao Iraque, Swoff e seus companheiros vão ficando cada vez mais distantes da ação real – e, quando ela aparece, é decepcionante; o que faz com que eles comecem a questionar a validade da batalha que estão travando.

“Soldado Anônimo” prega muitas peças no espectador. Por mostrar um lado mais maçante da guerra, o filme foi totalmente incompreendido – especialmente pelo público norte-americano. O que chega nas nossas mentes, ao final de “Soldado Anônimo”, é que Sam Mendes fez um filme extremamente crítico – ao contrário de todas as evidências –, pois mostrou soldados que, apesar de não terem disparado um só tiro durante o conflito, voltaram com as mesmas marcas que aqueles que viram as maiores atrocidades. Para nós, Swofford e seus companheiros são rapazes sortudos. Para Sam Mendes, toda guerra é igual. E o pior é que os norte-americanos, nas palavras do próprio Anthony Swofford, continuam a estar no deserto.

Se Eu Fosse Você (2006)



Já virou uma tradição da indústria cinematográfica brasileira: todo ano novo começa com a estréia de um filme nacional. Foi assim em 2004, com o filme “Sexo, Amor e Traição”, do diretor Jorge Fernando; em 2005, com “Meu Tio Matou um Cara”, do diretor gaúcho Jorge Furtado; e continua em 2006, com a estréia de “Se Eu Fosse Você”, do diretor Daniel Filho.

O filme, que é estrelado por Tony Ramos e Glória Pires (não por acaso, os dois interpretaram recentemente um dos pares românticos da novela “Belíssima”), conta a história do casal Cláudio e Helena. Ele, um publicitário bem-sucedido, dono de sua própria agência de propaganda e vencedor de inúmeros prêmios na área. Ela, uma professora de música; que se dedica a dirigir o coral de meninas de um colégio católico; a cuidar da casa, da filha e de si mesma; além de administrar as tensões existentes entre Cláudio e sua mãe (Glória Menezes).

Aparentemente, a vida que Cláudio e Helena levam é perfeita, mas, na realidade, os dois já sentem a rotina da relação. Um dia, uma das raras brigas que eles têm toma um rumo inesperado e quando eles acordam no dia seguinte notam que eles trocaram de corpos. Depois de um susto inicial, Cláudio e Helena procuram mostrar naturalidade enquanto tentam resolver a situação. Ao assumirem por completo a vida um do outro, Cláudio e Helena terminarão se compreendendo mais e aprendendo quais são as fraquezas e as virtudes de cada um.

Situações como as vivenciadas por Cláudio e Helena já foram abordadas aos montes no cinema – na última delas, “Sexta-Feira Muito Louca”, a mãe interpretada por Jamie Lee Curtis toma o corpo da filha interpretada por Lindsay Lohan e vice-versa. “Se Eu Fosse Você” não traz nada de original ao tema e repete cenas já vistas em outros filmes do gênero. O filme só se salva, pois seus atores principais são Tony Ramos e Glória Pires. Ele, especialmente, soube retratar com perfeição as agruras de alguém que se vê metido em uma situação aparentemente irreversível.

Os Produtores (The Producers, 2005)



“Primavera Para Hitler” foi o primeiro filme do diretor, escritor e ator Mel Brooks. Lançado em 1968, o filme fazia uma sátira aos grandiosos musicais da Broadway. Trinta e três anos depois do lançamento do filme, em 2001, Brooks, atendendo a uma sugestão de sua esposa, a atriz Anne Bancroft (falecida no ano passado), transformou o roteiro de “Primavera Para Hitler” em um musical. “Os Produtores” é um dos maiores sucessos recentes da história da Broadway, ganhou o número recorde de 12 Tonys (o Oscar dos musicais) e, agora, faz o caminho de volta para o cinema.

“Os Produtores” conta a história de Max Bialystock (Nathan Lane, excelente), um produtor que já foi grande e hoje só coleciona fracassos, e de Leo Bloom (Matthew Broderick), um contador que sonha se tornar o produtor de grandes musicais da Broadway. Leo é o contador de Max e, ao ver as contas mal administradas do produtor, acaba sugerindo – sem querer – um plano perfeito para o malandro Max: produzir de maneira superfaturada um musical fadado ao fracasso e, conseqüentemente, encher os bolsos com o dinheiro alheio.

O plano de Max e Leo parece ser infalível à primeira vista. Eles conseguem o pior roteiro – escrito pelo alemão Franz Liebkind (Will Ferrell), o pior diretor – Roger de Bris (o ótimo Gary Beach) e o pior elenco – encabeçado pela estonteante loira sueca Ulla (Uma Thurman). Sendo que, no dia da estréia do musical, o show – que pretendia contar a história da ascensão de Hitler ao poder na Alemanha – é encarado como uma grande comédia de ridicularização da figura do Führer. Com o sucesso do musical garantido, a dupla Max e Leo entra em sérios apuros.

“Os Produtores” tem a aura de um grande musical clássico de Hollywood. Sua história garante momentos engraçadíssimos para a platéia – tente não rir com as cenas de Roger de Bris, sua assistente Carmen Ghia (o hilário Roger Bart, o farmacêutico George do seriado “Desperate Housewives”) e sua trupe de figurinista, coreógrafo e desenhista de sets. Grande parte do sucesso de “Os Produtores” se deve à manutenção da maioria do elenco original do musical. É justamente pelo fato de que eles dominam o roteiro escrito por Mel Brooks, que eles flutuam em cena e dão a impressão de estarem em um grande palco. “Os Produtores” faz jus à fama de escritor corrosivo que acompanha a carreira de Mel Brooks e confirma – através das loucuras de Max, Leo e seus “comparsas” – uma frase conhecida e eternizada nos próprios musicais de Hollywood: “there is no business like show business”.

A Passagem (Stay, 2005)



É incrível como em, num único ano, um diretor pode ir de um extremo a outro com o seu trabalho. Foi exatamente isso que aconteceu com o diretor Marc Forster no ano de 2005. No início do ano passado, estreava no Brasil “Em Busca da Terra do Nunca”, uma verdadeira fábula sobre um escritor (James Barrie) que reencontra a sua inspiração ao entrar em contato com uma família que igualmente precisava de um toque a mais nas suas vidas. Já na virada para o ano de 2006, estreou no Brasil o último trabalho de Forster: “A Passagem”, um filme denso e difícil, que trata basicamente da luta de um homem para fazer com que outro não desista de sua vida.

Em “A Passagem”, o ator escocês Ewan McGregor interpreta o psicólogo Sam Foster, que trabalha em uma universidade de Nova York. Ao cobrir a folga de uma colega, acaba conhecendo Henry Letham (o excelente Ryan Gosling), um aluno da escola de artes. Henry é um jovem completamente problemático, que não gosta de seguir regras pré-estabelecidas e que tem um estilo de vida muito diferente do da maioria dos jovens. O estudante se isola do mundo e não deixa que Foster penetre na sua mente. A falta de um contato mais aberto entre médico e paciente fará com que Sam se desespere quando Henry confessa ao psicólogo os seus planos de cometer suicídio.

Sem saber como ajudar Henry, Sam parte em uma misteriosa e intrigante jornada em busca da verdadeira personalidade de Henry. Jornada esta que ressuscitará alguns dos medos mais internos do psicólogo – todos eles relacionados à namorada dele, a professora de arte Lila (Naomi Watts), que já tentou o suicídio. Sam trata Lila, às vezes, como uma paciente, por isso continua a receitar remédios controlados para a namorada. A falta de confiança de Sam em Lila faz com que ele não tenha coragem de pedi-la em casamento – uma vez que ele não sabe se a namorada está se sentindo bem de verdade.

O elemento mais importante de “A Passagem” não é a boa direção de Marc Forster nem o seu excelente elenco. O ponto chave do filme é o roteiro de David Benioff (autor também dos filmes “A Última Noite”, que foi baseado em um de seus livros, e do épico “Tróia”), o qual exige uma atenção redobrada dos membros da platéia. Assim como Henry e Sam, que têm problemas para distinguir o que é real do que não é, a platéia também ficará no escuro durante todo o filme. Só nos momentos finais de “A Passagem” é que a verdade será revelada; e, mesmo assim, de uma maneira que não é satisfatória.