Monday, February 20, 2006

Ponto Final (Match Point, 2005)



O ex-jogador de tênis Chris Wilton (Jonathan Rhys-Meyers), o personagem principal de “Ponto Final”, novo filme do diretor e roteirista indicado ao Oscar 2006 Woody Allen, critica a subestimação que a sorte ganha na vida das pessoas. Para ele, o trabalho árduo e a competência são fundamentais para o caráter de qualquer pessoa, mas, de nada irá adiantar você ter essas duas qualidades, se você não tem o primordial: a sorte para levá-lo (a) aos lugares que você mais deseja chegar – afinal de contas, se a vida fosse um jogo de tênis, quando a bola batesse na rede, “se a bola cair do lado oposto da quadra, você ganha; e, se cair do seu lado da quadra, você perde”.

A sorte irá andar ao lado de Chris na primeira hora de “Ponto Final”, tendo em vista que ele, depois de abandonar a carreira de tenista profissional, se muda para Londres, aonde arruma um emprego como instrutor de tênis num exclusivíssimo clube londrino. Chris, então, começa a dar aulas de tênis para os ricaços ingleses e acaba conhecendo Tom Hewett e sua família. Chris termina por conquistar a confiança da família Hewett, passando a trabalhar nas empresas da família e a freqüentar os mesmos ambientes chiques e sofisticados que eles; e ainda ganha mais: o amor da única filha dos Hewitt, Chloe (Emily Mortimer), com quem ele acaba se casando.

No entanto, Chris entra de cabeça no azar quando conhece a bela e sensual aspirante a atriz Nola Rice (Scarlett Johansson, que vem sendo chamada de “a nova musa de Woody Allen”), noiva de Tom. A desgraça de Chris é decretada quando ele acaba se rendendo aos encantos de Nola, com quem começa a ter um romance movido à pura paixão e atração física. É a partir do momento em que Chris e Nola se envolvem emocionalmente, que Woody Allen começa a destilar uma série de influências a alguns elementos que estão presentes em “Ponto Final”. Por exemplo: o romance entre Nola e Chris só pode terminar em uma tragédia como as óperas que os personagens do filme tanto gostam de assistir. E o maior crime de Chris não é aquele que ele acabará cometendo, e sim o de não estar preparado para enfrentar as conseqüências de seus atos – e correr o risco de perder tudo aquilo pelo qual ele tanto lutou: o luxo e a riqueza que passou a ter com a família Hewett.

“Ponto Final” vem sendo retratado pelos críticos em geral como o renascimento da carreira de Woody Allen como diretor e roteirista, que andava meio morna nos últimos anos – talvez por sentir a falta de elementos novos à extensa filmografia deste diretor e roteirista. Em “Ponto Final”, Woody Allen abraça alguns elementos novos. A ação do filme não se passa na amada Nova York do diretor, e sim em Londres. “Ponto Final” não tem toques de humor e fina ironia, como os outros filmes de Allen; nesse sentido, o filme é uma pura tragédia, com uma história que manipula por muitas vezes a interpretação que o público faz da trama. “Ponto Final” é um filme muito rico e intrigante, que retrata o momento crucial em que um diretor e roteirista, finalmente, reencontrou a sorte que ele mesmo havia perdido.

Crédito Foto: Yahoo! Movies

Orgulho e Preconceito (Pride & Prejudice, 2005)



Na Inglaterra do século XIX, numa época em que as mulheres eram criadas para se casarem logo cedo, Lizzie Bennet (Keira Knightley, a zebra na indicação para o Oscar 2006 de Melhor Atriz) era totalmente diferente das outras garotas. Lizzie não tinha nenhum dos atributos consideráveis de uma “garota para casar” (ela não sabia pintar, desenhar ou tocar piano); mas, tinha uma sensibilidade exarcebada e uma determinação: só se casar quando encontrasse o seu grande amor – talvez um amor igual ao que ela vê em muitos dos livros que ela lê.

Lizzie é a segunda filha de um casal (Donald Sutherland e Brenda Blethyn) em decadência financeira. Ao lado de suas quatro irmãs (Jane, Lydia, Kitty e Mary), eram as esperanças dos pais para que encontrassem um casamento de conveniência para livrarem a família da miséria. Em um baile, Lizzie e sua irmã mais velha Jane (Rosamund Pike) irão conhecer os ricos Sr. Bingley e o Sr. Darcy (Matthew MacFadyen). Enquanto Jane e o Sr. Bingley trocam flertes, Lizzie estabelece uma relação de amor e ódio com o Sr. Darcy.

É bom fazer um parêntese neste momento, porque, durante a maior parte de “Orgulho e Preconceito”, filme de Joe Wright baseado no clássico romance de Jane Austen (uma das maiores escritoras inglesas de todos os tempos), a visão que a platéia tem do Sr. Darcy é aquela que nos é passada por Lizzie. Dominada pelo seu preconceito (de que todos os ricos são pessoas iguais e intragáveis), Lizzie só enxerga Darcy como um cavalheiro rico, arrogante, rude, taciturno, introvertido e antipático. Ou seja, Darcy é apresentado para nós da platéia como um galã completamente às avessas.

Na medida em que as peças da narrativa do filme vão se encaixando e os mal-entendidos vão sendo colocados em pratos limpos, entra em cena a segunda porção da personalidade de Lizzie. Em decorrência do seu orgulho, ela hesita durante muito tempo em admitir que ela talvez estava errada sobre quem era Darcy e que ele não é tão desagradável quanto parece. É justamente quando Lizzie começa a perceber estes certos detalhes que “Orgulho e Preconceito” começa a ganhar a sua maior força, se transformando em um filme que contém todos os ingredientes de uma linda história de amor.

Grande parte do carisma de “Orgulho e Preconceito” vem dos personagens – e, em conseqüência, dos atores que os interpretam. Keira Knightley começa interpretando Lizzie com um show de caras e bocas, mas, na medida em que a sua personagem vai amadurecendo, a atriz encontra o tom certo e faz a melhor performance de sua (ainda curta) carreira. Brenda Blethyn como a mãe alcoviteira está engraçadíssima. Rosamund Pike, Jena Malone, Talulah Riley e Carey Mulligan como as irmãs doidas para se casar de Lizzie estão perfeitas. Judi Dench, na pequena participação que faz no filme, também está impecável. Já Matthew MacFadyen interpreta Darcy com uma performance tão econômica e, ao mesmo tempo, tão intensa, que, desde a sua primeira aparição em tela, já ganha a simpatia da platéia – o que faz a torcida por ele e Lizzie se acertarem ser logo instantânea.

Tudo isso é a prova de que a história criada por Jane Austen continua a ter força mesmo depois de anos após ser escrita. Em seu primeiro longa metragem, o diretor Joe Wright entrega um filme sem erros e que tem um excelente trabalho de reconstrução de época – os figurinos e a direção de arte de “Orgulho e Preconceito” foram merecidamente indicados ao Oscar 2006 –, sem esquecer de retratar aquela grande paisagem bucólica inglesa, que exala um ar de ingenuidade e de frescor. Em outras palavras, o lugar perfeito para presenciar o nascimento de uma bela, forte e inesquecível história de amor.

Crédito Foto: Yahoo! Movies

Syriana - A Indústria do Petróleo (Syriana, 2005)



A primeira cena de “Syriana – A Indústria do Petróleo”, do diretor e roteirista indicado ao Oscar 2006 de Melhor Roteiro Adaptado Stephen Gaghan, já é bastante emblemática. Vemos o agente da CIA Robert Baer (George Clooney, indicado ao Oscar 2006 de Melhor Ator Coadjuvante e também produtor executivo do filme) numa festa, confraternizando com o homem com quem ele pretende fazer negócios. A cena mostra meticulosamente o método de trabalho adotado por Baer: se aproximar das pessoas certas, mas se for traído por algumas delas, ele não irá hesitar em assassiná-las ou, na melhor das hipóteses, em acabar com todos os seus planos.

Robert Baer é só o primeiro vértice de uma narrativa dividida em vários personagens – bem ao estilo de “Traffic”, o outro filme escrito por Stephen Gaghan. São eles: Bryan Woodman (Matt Damon), um analista de energia que é dono de uma pequena empresa de derivados na Suíça e que, depois de uma tragédia familiar, se afunda no trabalho e ganha a confiança do filho do governante máximo de um país do Oriente Médio; Bennett Holiday (Jeffrey Wright, mais conhecido pelo seu trabalho como o enfermeiro da premiada peça e série de TV “Angels in America”), um advogado que está investigando a fusão entre duas empresas que se dedicam à exploração de petróleo no Oriente Médio, a Connex e a Killen; e um jovem muçulmano, que trabalhava em uma empresa de extração de petróleo, mas, depois que perdeu o emprego, fica sem qualquer possibilidades de arrumar um outro trabalho.

Estes quatro personagens possuem alguns elos entre si: todos eles estão brigando – alguns sabendo e outros não – pelos direitos de extração de petróleo em um país do Oriente Médio, além de estarem em busca de algum tipo de poder (seja ele político ou econômico). “Syriana – A Indústria do Petróleo” mostra que esta luta pelo poder é um embate ainda mais grave, pois envolvem interesses (políticos e, em alguns casos, pessoais) que estão além de qualquer escrúpulo que o ser humano pode ter.

Nesse sentido, “Syriana – A Indústria do Petróleo” é um veículo de crítica a várias organizações. A primeira delas, é claro, é o governo dos Estados Unidos, que é o país que mais consome petróleo no mundo, mas não produz o suficiente para atender à sua demanda interna. Por isso que existe tanto interesse dos políticos e dos grupos econômicos norte-americanos para que o país exerça uma influência decisiva dentro do Oriente Médio - a área mais rica em produção de petróleo no mundo, além de ser um local cheio de países altamente manipuláveis. Em segundo lugar, o filme faz uma crítica à CIA, a Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos, por deixar que suas ações sejam pautadas por um fim mais político e que favoreça a entrada dos Estados Unidos nos países em que eles tenham mais interesses econômicos e comerciais.

Em alguns momentos, “Syriana – A Indústria do Petróleo” parece mais um ensaio teórico e crítico do que com um filme. Por esta razão, o que se sobressai mais na película não são as boas atuações de seu elenco ou a segura direção de Stephen Gaghan, e sim o roteiro escrito pelo diretor. “Syriana – A Indústria do Petróleo” é um grande tratado sobre a corrupção nos Estados Unidos e, para tanto, Gaghan entrega à platéia um roteiro rico em informações – o que exige atenção máxima da platéia, pois, cada dado perdido, pode resultar num mau entendimento das histórias que compõem o filme. O final de “Syriana – A Indústria do Petróleo” é extremamente pessimista e não mascara a realidade; mas, Stephen Gaghan não se propôs a apresentar soluções com seu filme, e sim a relatar fatos e a contar uma história – e ele fez isso de uma maneira incrível.

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Johnny & June (Walk the Line, 2005)



A cinebiografia “Johnny & June”, do diretor e co-roteirista James Mangold, começa em 1968, no ano que antecedeu a fase mais popular da carreira do cantor Johnny Cash (Joaquin Phoenix, indicado ao Oscar 2006 de Melhor Ator). Foi neste ano que o cantor gravou os dois álbuns ao vivo mais bem-sucedidos de sua carreira, nas duas maiores prisões dos Estados Unidos: Folsom Prison (que deu o nome a uma de suas maiores canções, “Folsom Prison Blues”) e San Quentin – lugares nos quais o cantor se sentiu muito bem à vontade, tendo em vista que Cash cultivou cuidadosamente uma imagem de fora-da-lei, de selvagem e de bad boy.

Quando o roteiro de James Mangold e Gill Dennis penetra mais a fundo na vida de Johnny Cash, nos resta a conclusão de que o comportamento rebelde adquirido pelo cantor foi mais uma maneira que ele teve para se defender de todo o sofrimento que ele enfrentou na sua vida. Nascido na cidade de Kingsland, no Estado do Arkansas, com o nome de J.R. Cash, o cantor era filho de Ray (Robert Patrick), um fazendeiro pobre, alcoólatra e que não tratava bem a sua esposa e seus filhos. Trabalhando desde cedo em campos de algodão, o menino Cash tinha como hobby cantar os hinos religiosos que aprendeu com a sua mãe.

Cash era muito próximo de seu irmão mais velho Jack. Quando este morreu ainda criança, em decorrência de um acidente com uma serra de madeira, Johnny foi acometido por um forte sentimento de culpa (seu pai constantemente afirmava que preferia que ele tivesse morrido ao invés de Jack). Para aplacar a dor, Cash se afundou na música, aprendeu a tocar violão e começou a compor suas próprias canções. Cash desenvolveu seu dom enquanto estava servindo na Força Aérea Americana, mas foi obrigado a deixar os seus sonhos de lado quando, na volta para casa, acabou se casando com Vivian (Ginnifer Goodwin), e teve que sustentar a casa vendendo utensílios domésticos.

Apesar das suas novas responsabilidades, Cash não conseguiu deixar a música de lado e foi em busca de um teste com Sam Phillips (Dallas Roberts), dono de uma pequena gravadora em Memphis. Numa cena crucial para “Johnny & June”, vemos como Johnny Cash deixou a sua formação gospel e as músicas de temáticas mais esperançosas de lado para abraçar uma influência mais country, com pegadas de rock e blues, se transformando no poeta da desilusão – esta marca definiu toda a carreira de Cash, bem como todo um momento da música norte-americana, marcado também por ícones como Jerry Lee Lewis e Elvis Presley, ambos presentes no filme.

A partir deste momento, “Johnny & June” vira um road movie, acompanhando a trajetória de Johnny Cash rumo ao sucesso. Assim como em outras cinebiografias de músicos famosos, James Mangold e Gill Dennis não escondem nada e mostram também o caminho de autodestruição trilhado por Cash, quando ele se entregou às mulheres e se afundou no vício das drogas. Entretanto, “Johnny & June” toma um rumo diferente, pois, foi também neste seu momento mais baixo, que Cash conheceu aquela que seria o grande amor de sua vida, a também cantora e compositora June Carter (Reese Witherspoon, indicada ao Oscar 2006 de Melhor Atriz, mesmo que seu papel no filme seja de coadjuvante). Sem retratar nada de uma maneira piegas, Mangold e Dennis mostram como o amor de June e John salvou o cantor de ter um fim trágico – por ela, Johnny andou na linha (frase que faz alusão a uma das canções mais famosas de Cash, “I Walk the Line”, que também acabou servindo de inspiração para o nome original que o filme recebeu).

Até mesmo pela proximidade das datas de lançamento e pela atenção recebida nas premiações da indústria cinematográfica, é impossível não comparar “Johnny & June” com “Ray”, a cinebiografia de Ray Charles. Johnny Cash e Ray Charles tinham muito em comum: os dois tiveram uma tragédia familiar, marcaram seus nomes na história da música com a sua mistura de ritmos, se entregaram às mulheres e às drogas e quase perderam as pessoas que mais amavam por causa disso. Os dois também souberam agarrar as segundas chances que tiveram para acertarem as suas vidas.

Assim como “Ray”, “Johnny & June” é um filme vibrante, emocionante e empolgante como a música daqueles que os inspiraram. Os dois filmes também funcionam, principalmente, por causa de seus elencos. No caso particular de “Johnny & June”, o excelente elenco de apoio – com destaque para Robert Patrick e Ginnifer Goodwin, que estão fantásticos – dá todo o respaldo para que Joaquin Phoenix e Reese Witherspoon brilhem em cena. Os dois atores principais são um show à parte e passam de maneira verdadeira para o público tudo aquilo que aconteceu com Johnny Cash e June Carter – o amor dos dois foi tão profundo que Carter se foi primeiro, mas Cash não agüentou muito tempo sem sua amada e foi logo em seguida ao seu encontro.

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Tuesday, February 07, 2006

O Segredo de Brokeback Mountain (Brokeback Mountain, 2005)



Mais até do que Ennis Del Mar (Heath Ledger, indicado ao Oscar 2006 de Melhor Ator) e Jack Twist (Jake Gyllenhaal, indicado ao Oscar 2006 de Melhor Ator Coadjuvante), o maior personagem de “O Segredo de Brokeback Mountain”, de Ang Lee (indicado ao Oscar 2006 de Melhor Diretor), é a própria montanha Brokeback. Nos primeiros 30 minutos do filme, ela reina absoluta servindo como pano de fundo para Ang Lee mostrar à platéia a sua história e a sua dupla de protagonistas. É na montanha Brokeback que nasce o amor entre Ennis e Jack – o primeiro, um bruto e rude trabalhador rural e o segundo, um cowboy sedutor e meio rebelde. Para Ennis e Jack, os dias que eles passaram na montanha são mais do que uma lembrança de um momento especial que eles viveram no verão de 1963, e sim os únicos momentos aonde eles puderam ser aquilo que eles realmente eram de verdade.

Depois destes primeiros momentos, “O Segredo de Brokeback Mountain” se divide em duas linhas de narração. A primeira – e principal –, segue Ennis, que volta para a cidade do Wyoming aonde mora para se casar com Alma (Michelle Williams, indicada ao Oscar 2006 de Melhor Atriz Coadjuvante), a namorada que havia deixado enquanto foi trabalhar na montanha Brokeback. A segunda, parte em busca de Jack, que segue uma trajetória errante de cowboy nos rodeios dos Estados Unidos, até que ele sossega ao lado de Lureen (Anne Hathaway), a filha de um comerciante de veículos agrícolas.

Ennis e Jack constroem a sua vida longe um do outro, mas a ligação que eles estabeleceram na montanha Brokeback será forte e eterna. Eles passam inicialmente quatro anos sem se ver, depois passam a se encontrar mensalmente; até chegar a um ponto em que os encontros entre os dois passam a ser cada vez mais freqüentes e suspeitos – Alma passa a desconfiar cada vez mais das saídas constantes de Ennis com o “parceiro de pescaria” (maneira pela qual ele se refere a Jack).

Em todo o decorrer de “O Segredo de Brokeback Mountain” – filme baseado no conto de Annie Proulx – fica muito claro a preocupação que os roteiristas Larry McMurtry e Diana Ossana tiveram em construir bem os seus personagens. Ennis, que foi criado em uma família rígida do interior dos Estados Unidos, aprendeu que ser homossexual é errado (em nenhum momento do filme, ele se assume como tal), e não consegue encontrar uma maneira de lutar contra os seus sentimentos. Jack, ao contrário, se sente confortável com a sua opção. Alma não sabe como lidar – ou não quer reconhecer – a verdadeira personalidade de Ennis. Já Lureen, mais imersa na sua própria vida, não consegue ver que a felicidade de Jack se encontra milhas longe dela.

Essa preocupação também está na mente dos atores de “O Segredo de Brokeback Mountain”. Heath Ledger brilha como Ennis, compondo o personagem de maneira introspectiva e que revela que ele carrega em si uma amargura pelas escolhas de vida que fez, uma confusão de pensamentos e um segredo muito grande. Jake Gyllenhaal, por outro lado, abraça todo o carisma e o caráter sedutor de Jack. Michelle Williams também retrata com competência o dilema vivido por Alma. Anne Hathaway se mantém discreta durante o filme, mas, com uma cena, retrata com perfeição o entendimento que Lureen finalmente parece ter da relação existente entre Ennis e Jack.

“O Segredo de Brokeback Mountain” – filme indicado a 8 Oscars 2006 – poderia ser um filme que cairia para um lado mais sensacionalista. Felizmente, isso não aconteceu. O filme é dirigido por Ang Lee com uma classe, sensibilidade e toques de razão que fazem com que a platéia se identifique com a história de amor entre Jack e Ennis. O filme exime a platéia de fazer qualquer tipo de julgamento e oferece ao público uma sensação de paz e tranqüilidade – intenção corroborada pela excelente trilha sonora de Gustavo Santaolalla, indicado ao Oscar 2006 de Trilha Sonora –, o que obviamente contrasta com o estado de inquietude e infelicidade constantes vividos por Jack e, principalmente, Ennis durante “O Segredo de Brokeback Mountain”.

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Saturday, February 04, 2006

Memórias de uma Gueixa (Memoirs of a Geisha, 2005)



Desde os primeiros momentos de “Memórias de uma Gueixa”, filme do diretor Rob Marshall (“Chicago”), já dá para notar que o sofrimento será a maior tônica da vida da garota Chiyo. Vendida pelo pai para um senhor, Chiyo é separada de sua irmã mais velha e é obrigada a morar na casa de uma senhora que só lhe trata mal. A mulher em questão só acolhe em sua casa garotas que, quando crescerem, possam vir a se tornar gueixas. Ela enxerga esse potencial em Chiyo, pois ela tem algo diferente das outras garotas: um par de olhos azuis, que fizeram com que sua mãe só lhe chamasse pelo nome de “Água”.

Porém, Chiyo não quer se transformar em uma gueixa. Tudo pelo que ela anseia é voltar para casa e estar novamente ao lado da irmã mais velha. O tempo mostrará para Chiyo que nem sempre os seus desejos podem se transformar em realidade e, assim como a água que ela carrega em seus olhos, Chiyo saberá como encontrar os caminhos certos para desaguar em algum local.

A platéia também começará a entender o por quê de Chiyo não querer se transformar em uma gueixa. A razão atende pelo nome de Hatsumomo (Gong Li, de “Lanternas Vermelhas”, fantástica), a gueixa adotada como filha pela mulher que acolheu Chiyo em sua casa. Hatsumomo é uma gueixa famosa e temperamental, cuja maior rival é Mameha (Michelle Yeoh, de “O Tigre e o Dragão”), uma gueixa mais velha e mais digna, vamos dizer assim, da tradição milenar japonesa.

Apesar de seu ódio pela pessoa de Hatsumomo, Chiyo sente uma grande atração pelo fascínio que a gueixa exerce nos homens e pelo luxo e beleza que ela carrega consigo. Acostumada a um tratamento ríspido dentro de casa, Chiyo toma a decisão de se transformar efetivamente em uma gueixa para ficar à altura do homem que lhe tratou com maior bondade (Ken Watanabe, de “O Último Samurai”).

Acolhida por Mameha como sua protegida, Chiyo aprende, em poucos meses, o que muitas meninas japonesas levam anos estudando e, dessa maneira, se transforma em Sayuri (Ziyi Zhang), a futura maior gueixa daqueles tempos. Como Sayuri, Chiyo irá conhecer um mundo misterioso, exótico e fascinante; mas, também conhecerá um outro lado cheio de inveja, rivalidade e no qual nem sempre “o mais forte vence”. Como gueixa, Chiyo devotará a sua vida a entreter os homens, a ser “uma obra de arte em movimento” e a esconder os seus desejos e vontades.

A partir do momento em que Chiyo se transforma em Sayuri, os elementos estéticos de “Memórias de uma Gueixa” começam a ganhar força, especialmente a fotografia de Dion Beebe. Preste atenção na cena em que Sayuri dança em um espetáculo feito especialmente para ela, e no qual ela tem que seduzir os homens e dar início a um leilão pelo bem mais precioso que ela tem – a sua virgindade. A fotografia, nessa cena, ganha tons diversos – no começo, ela é predominantemente azul e no final, vermelho. A dança de Sayuri é um dos poucos momentos poderosos de “Memórias de uma Gueixa”.

Baseado no romance internacionalmente aclamado de Arthur Golden, “Memórias de uma Gueixa” era para ser um filme sedutor e arrebatador, mas acaba não sendo nada disso. O roteiro do filme, escrito por Robin Swicord, é frio e não consegue envolver o espectador por inteiro na história da menina Chiyo. De nada adianta o filme ser visualmente rico (os figurinos e a direção de arte, além da já citada fotografia, são estupendas – tanto que estas foram três das seis categorias em que o filme foi indicado ao Oscar 2006), quando ele é fraco de conteúdo. No final de “Memórias de uma Gueixa”, a impressão que se tem é a de que acabamos de assistir a um produto em que só a embalagem é bonita, quando o que tem dentro dele é simplesmente oco.

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Boa Noite, e Boa Sorte (Good Night, and Good Luck, 2005)



No início dos anos 50, o povo norte-americano foi invadido por um sentimento que ganhou o nome de Temor Vermelho, o qual expressava um misto de raiva e medo sentido pelos norte-americanos em relação aos comunistas. Nessa época, membros do Congresso dos Estados Unidos passaram a difundir a idéia de que altos funcionários do governo do país estariam traindo a pátria. Nenhum congressista explorou mais esta idéia do que o Senador Joseph M. MacCarthy, do Estado do Wisconsin. Foi ele quem liderou a Comissão MacCarthy contra Atividades Anti-Americanas, que investiu pesado em cima dos norte-americanos – especialmente em cima de profissionais da indústria cinematográfica hollywoodiana, professores universitários, estudantes e sindicalistas -, esnobando os direitos civis garantidos pela Constituição dos Estados Unidos. A Comissão liderada por MacCarthy durou exatos cinco anos e manchou a história política norte-americana.

Durante o funcionamento da Comissão MacCarthy contra Atividades Anti-Americanas poucos jornalistas ousaram criticar os métodos de investigação do Senador MacCarthy. Um dos que se levantaram contra a Comissão foi o jornalista da rede CBS, Edward R. Murrow (David Strathairn, numa performance natural e sem esforços, que lhe rendeu a merecida indicação ao Oscar 2006 de Melhor Ator), que, com a sua equipe de profissionais, fez uma série de reportagens que desmascararam as falcatruas políticas impetradas pelo Senador Joseph M. MacCarthy.

Edward R. Murrow é justamente o personagem principal da cinebiografia “Boa Noite, e Boa Sorte” (a frase de despedida do jornalista para o seu público quando os seus programas jornalísticos – “See it Now” e “Person to Person” – terminavam), do diretor, ator e roteirista George Clooney. O jornalismo não é um território desconhecido para Clooney, uma vez que seu pai, Nick, foi âncora de telejornais nos Estados Unidos e, hoje, tenta se dedicar a uma carreira política.

“Boa Noite, e Boa Sorte” - filme indicado a 6 Oscars 2006, incluindo Melhor Filme, Diretor e Roteiro Original - pode estar situado nos anos 50, mas o que os roteiristas George Clooney e Grant Heslov tentam mostrar é que o que aconteceu na época de Joseph M. MacCarthy continua a ocorrer nos dias de hoje. Substituiu-se o Temor Vermelho pela paranóia antiterrorista. Sai de cena a Comissão MacCarthy de Atividades Anti-Americanas e entram no quadro a CIA e o FBI, que violam os direitos constitucionais dos norte-americanos e, em busca de dizimar qualquer ameaça, não hesitam em violar as correspondências da população ou de colocar as pessoas na humilhante situação de terem que ser revistadas nos aeroportos. Uma frase brilhante do roteiro neste sentido é a seguinte: “como podemos impor a liberdade aos países estrangeiros, quando nós mesmos não a respeitamos”.

O filme também lembra o importante papel que os meios de comunicação – no caso particular de “Boa Noite, e Boa Sorte”, a televisão – desempenham em momentos de crise. Num país democrático, em um livre ambiente de trabalho (longe das pressões dos superiores ou dos patrocinadores), e com liberdade de expressão, Edward R. Murrow e sua equipe foram além da simples tarefa de entreter seus telespectadores. Eles contestaram, informaram, educaram, transformaram os acontecimentos e tiveram a oportunidade de fazer história. Ao mostrarem isso, George Clooney e Grant Heslov não deixam de fazer uma crítica à atual situação vivida pela imprensa norte-americana, que assiste passivamente ao governo de George W. Bush, deixando escapar a oportunidade de investigar temas controversos como a Invasão ao Iraque e o por quê da manutenção das tropas neste país até os dias de hoje – nós estamos vivendo o contrário aqui no Brasil, em que a imprensa desempenhou (e continua a exercer) um papel fundamental na denúncia e investigação dos escândalos do Governo Lula.

Magnificamente fotografado em preto e branco por Robert Elswit (também indicado ao Oscar 2006), “Boa Noite, e Boa Sorte” também marca o nascimento de uma nova proposta de se fazer filmes em Hollywood. A co-produtora do filme foi a Participant Productions, empresa criada pelo ex-proprietário do site de leilões E-Bay e que tem como objetivo produzir filmes que carreguem mensagens de relevância para a sociedade. “Boa Noite, e Boa Sorte” foi o primeiro filme da empresa. “Syriana”, um thriller de espionagem estrelado por George Clooney e Matt Damon, e escrito por Stephen Gaghan (de “Traffic”), foi o segundo. “Terra Fria”, filme de Niki Caro e com Charlize Theron e Frances McDormand no elenco, que retrata um caso de assédio moral e sexual numa mina dos Estados Unidos, foi o terceiro. Todos os três filmes estão indicados para o Oscar e atraíram grande atenção do público, o que confirma uma demanda por filmes bons e, principalmente, inteligentes por parte da audiência.

Crédito Foto: Yahoo! Movies

Nanny McPhee - A Babá Encantada (Nanny McPhee, 2005)



À primeira vista, a trama de “Nanny McPhee – A Babá Encantada”, do diretor Kirk Jones, se assemelha muito à do filme “A Noviça Rebelde”, de Robert Wise; afinal os dois filmes falam de duas mulheres que são enviadas para a casa de um homem viúvo para cuidar dos seus filhos pestinhas. A diferença é que a babá Nanny McPhee (Emma Thompson, também autora do roteiro do filme) utiliza os seus poderes mágicos para controlar o comportamento dos sete filhos de Cedric Brown (Colin Firth); enquanto que, em “A Noviça Rebelde”, Maria (Julie Andrews) usa a música para domar os filhos do Capitão Von Trapp (Christopher Plummer).

Se “A Noviça Rebelde” se passava num momento quase posterior à invasão da Áustria pela Alemanha – o que deixava o Capitão Von Trapp numa situação delicada, pois, como servidor do exército austríaco, ele não queria se reportar para Adolf Hitler; “Nanny McPhee – A Babá Encantada” retrata a vida em um pacato vilarejo inglês, no qual Cedric Brown ganha a vida em uma casa funerária e tenta cuidar dos seus sete filhos. A vida da família Brown ficou mais difícil após a morte da esposa de Cedric. Em conseqüência disso, os sete filhos do casal viraram crianças levadas e travessas e que não aceitavam nenhum tipo de ato disciplinar.

É neste momento em que Nanny McPhee entra em cena, para ensinar cinco lições básicas aos filhos de Cedric: se deitar quando forem mandados, se levantar quando forem mandados, se vestir apropriadamente, saber ouvir e aceitar ordens. A presença de Nanny McPhee será ainda mais importante para a família Brown, pois Cedric enfrenta um grande conflito pessoal: se ele não se casar novamente em um mês, perderá a mesada que recebe de sua Tia Adelaide (Angela Lansbury) e, conseqüentemente, não conseguirá mais sustentar a sua casa e perderá a guarda dos seus filhos.

Baseado na série de livros infantis escritos por Christianna Brand, “Nanny McPhee – A Babá Encantada” é um filme cheio de exageros, especialmente no que diz respeito ao uso de cores nos figurinos, na direção de arte e na fotografia. Algumas personagens do filme, como Selma Quickly (Celia Imrie), a aspirante à noiva de Cedric, são naturalmente espalhafatosas. No entanto, “Nanny McPhee – A Babá Encantada” apela acertadamente para a força do seu simples roteiro, o qual é cheio de situações bobas e engraçadas, para ganhar a empatia do público.


Crédito Foto: Cine Pop

Dizem por Aí (Rumor Has It, 2005)



Não é novidade nenhuma para o público freqüentador das salas de cinema que a indústria cinematográfica hollywoodiana passa por uma grande crise –uma econômica e outra mais grave de idéias. Quando não estréiam remakes de filmes antigos (caso do recente “As Loucuras de Dick e Jane”), são lançados filmes baseados em seriados de TV (caso de “Miami Vice”, filme que estreará ainda em 2006). A última moda é fazer películas baseadas nas vidas de personalidades (caso de “Capote” e “Johnny e June”, ambos indicados nas principais categorias do Oscar 2006). A comédia romântica “Dizem por Aí”, do diretor Rob Reiner, inaugura um novo filão, ainda sem características definidas, pois conta a história de uma mulher que acredita que a sua família serviu de inspiração para o livro “The Graduate”, de Charles Webb –o qual, por sua vez, deu origem ao filme “A Primeira Noite de um Homem”, de Mike Nichols.

Sarah Huttinger (Jennifer Aniston), a personagem principal de “Dizem por Aí”, tem muitas características parecidas com as de Benjamin Braddock, o protagonista de “A Primeira Noite de um Homem”. Se Benjamin voltou para casa após se formar para enfrentar as cobranças de seus pais para que encontrasse uma boa mulher para se casar e arranjasse um emprego bem-sucedido; Sarah volta para Pasadena, a sua cidade natal, para o casamento de Annie (Mena Suvari), a sua irmã mais nova, presa a um emprego sem possibilidades de crescimento profissional e noiva de um homem perfeito e que lhe dá segurança e proteção – o advogado Jeff (Mark Ruffalo).

No entanto, Sarah, assim como Benjamin, não se sente preparada para enfrentar as cobranças e as responsabilidades que advêm da vida a dois. Ela quer se encontrar antes de aceitar este desafio. É neste momento em que Sarah começa a se diferenciar de Benjamin, pois enquanto ele embarcou em uma aventura amorosa inconseqüente com uma mãe e sua filha; Sarah vai em busca das suas origens e as da sua falecida mãe indo ao encontro de Beau Burroughs (Kevin Costner), um homem rico e sedutor, mas que vive preso no passado que viveu com Jocelyn, a mãe de Sarah.

“Dizem por Aí”, ao contrário de “A Primeira Noite de um Homem”, não é um drama bem construído; e sim uma comédia que mistura momentos que visam ao alcance do mais puro riso com aqueles que são dignos de um bom romance. Dirigido com regularidade por Rob Reiner, o ponto alto do filme é a atuação de Jennifer Aniston, uma atriz que, além de possuir um timing cômico perfeito (e já conhecido dos fãs do seriado “Friends”, no qual Aniston interpretou a patricinha Rachel Green), sabe muito bem fazer as cenas que exigem uma carga dramática maior.


Crédito Foto: Yahoo! Cinema